segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Eu não quero mais

Coloquei o pé em uma sala de aula pela primeira vez em 2003 como professor. Naquela época tive a sorte (ou azar) de estagiar em uma excelente escola, com uma professora absolutamente maravilhosa, que ajudou muito a iniciar minha carreira.

Fiquei maravilhado com a possibilidade de ensinar. Ver os resultados de atividades que ministramos, as perguntas interessadas dos alunos, a admiração que eles criam pela figura do professor. Tudo isso foi uma incrível tentação, uma alegria e realização profissionais, que me cativaram, e fizeram com que tivesse vontade de atuar nesta área.

Hoje, cerca de seis anos depois, olho pra trás, e vejo o quanto fui iludido. Não existe respeito, não existe admiração, interesse, nada. Os pais são, em sua maioria, completamente alheios a tudo, vendo a escola como um depósito de crianças, dando uma trégua no cansaço que é a criação dos filhos.

Os alunos desrespeitam os professores com agressões verbais, morais... tudo! Não participam das aulas, não se interessam em nada por aquilo que você está dizendo. Como professor, me sinto como uma verdadeira peça de decoração, alegrando o dia de algumas crianças entediadas.

Alguns professores mais ditadores ainda conseguem o mínimo de silêncio, e alguma colaboração, mas claramente superficial, uma vez que o interesse não é conquistado através de ditadura.

Por sua vez, o governo critica os professores, colocando a culpa na categoria, por toda sua incompetência em governar. Nós somos fracos, nós não temos capacidade de controlar uma sala de aula, nós não somos capazes de criar uma aula interessante. Sempre nós.

Nós enfrentamos salas lotadas. Nós enfrentamos uma infra estrutura absolutamente precária. Nós temos que trabalhar em três turnos para termos o suficiente para sobrevivermos. Nós temos que encarar duras realidades, como alunos (aos baldes) viciados em droga, alunos cujos pais estão no mundo do crime, ou são igualmente viciados, ou violentos, ou mães prostitutas, falta de amor, entre outros. Nós, como profissionais de nível superior, temos os piores salários dentre todos os formados. Nós somos obrigados a ministrar o que quer o governo, mesmo sabendo o quão ruim são as escolhas. Nós somos tratados como lixo por todos.

Não foram uma, nem duas as vezes que senti uma vontade incrível de promover uma chacina generalizada pela raiva que passo com esta profissão. Mas este não é o pior. O que realmente acaba com qualquer ânimo é você estudar ao longo de uma vida, investir dinheiro, abrir mão de uma série de coisas, e não ver nenhum resultado (fato que só presenciei na educação, em relação a todas as áreas que trabalhei, igualmente estressantes).

Assim como é frustrante termos que nos contentar em “salvar” um em cada cem, porque os demais não aceitam o sistema, não aceitam a realidade de suas vidas, e não têm muita maturidade (e interesse) em mudar por outros caminhos. É igualmente frustrante você ver que todo mundo acha que o professor tem o dever de criar o caráter do cidadão, de educá-lo moralmente, quando esta função, segundo nossa própria constituição, é de TODOS, especialmente da família.

Ser professor é o mesmo que correr alucinadamente em círculos. Ser professor do estado é ainda pior, pois nem direito a ficarmos doentes (o que neste caso é extremamente fácil) temos, pois podemos apenas seis vezes por ano ir ao médico!

Quantas leis estão sendo criadas que prejudicam sobremaneira a vida do professor? Leis que impõe situações que deveriam ser construídas no dia a dia, de baixo pra cima, não o contrário!

Tudo isso pra ganhar uma merreca, enquanto algumas outras profissões, algumas de exigência de nível médio, pagam bem melhor, e apresentam muito maior satisfação.

É uma luta desesperadora para manter a satisfação, para manter o ânimo, para ter alegria em trabalhar. Uma luta contra tudo e contra todos, inclusive nós mesmos. Uma luta para que sejam mantidos vivos todos os sonhos de uma vida, para que mantenhamos vivo tudo aquilo que realmente acreditamos. Uma luta cruel, injusta, e impossível. Uma luta que dia após dia, estamos perdendo. Uma luta que acaba com o humor de qualquer um, que prejudica sua vida pessoal, que prejudica sua habilidade em aprender, prejudica sua saúde.

Não há um só dia que milhares de profissionais que atuam nesta área não terminem o dia com uma conhecida frase nesta carreira: “Eu não quero mais isso pra mim!”.

É justo isso?

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