quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Crítica ou ataque?

http://whiplash.net/materias/opinioes/063543.html


A partir de finais do século XIX a arte sofreu uma gigantesca transformação, com todas as suas concepções sendo viradas do avesso, a começar pelas artes visuais, seguida depois pela literatura, pela música, e pelo teatro. Quando surgiu ao mundo o Impressionismo, na pintura, muitos críticos vociferaram contra as novas formas de pintar daqueles artistas, acusando-os de borrarem a tela de maneira caótica. Com a vitória daqueles pintores, ao ganharem fama e reconhecimento, os críticos sofreram uma das mais fortes crises de sua história, e passaram a ser motivo de descrença por qualquer setor da sociedade.

Com maior ou menor velocidade, todos os povos passaram a ter uma impressão totalmente negativa dessa mesma crítica. Os críticos, no pior momento de sua profissão, passaram a ser muito mais cautelosos e comedidos em suas palavras. As críticas, principalmente a partir da segunda metade do século XX, após seguidas revoluções nas formas de expressão artística, tornaram-se algo essencialmente técnico, demonstrando todo o medo dessas pessoas caírem no ridículo de desprezarem algo que viria a tornar-se um divisor de águas na história da referida modalidade artística.

No entanto, parece que algumas pessoas ainda não aprenderam essa lição. Lembro-me de uma das mais célebres frases de Frank Zappa, a respeito da mídia especializada no rock: “são pessoas que não sabem escrever, para um público que não sabe ler”. Então, hoje, quando lemos uma revista especializada em rock, ou um site, com o mesmo conteúdo, constatamos que, via de regra, ele estava certo.

Primeiramente, alguns dos textos são tão mal escritos, que nem sequer merecem comentários sobre seu conteúdo: parecem fãs, revoltados ou extasiados com seus ídolos, no lançamento de um novo álbum, num show ou qualquer evento que tenha sua presença. Você definir a qualidade de uma música, num texto com grande alcance do público, como sendo “chata”, “maçante”, “muito longa” são coisas que realmente não condizem com um homem que viva no mundo literário.

Mas o pior nem vem a ser isso: as críticas são tão pesadas que deixam de ser uma coluna de opinião técnica a respeito de uma obra, para se tornarem um ataque fulminante contra alguma banda ou artista. E talvez seja essa a coisa mais incompreensível nesse meio. Se pegarmos especificamente o heavy metal, é impossível de não sentir uma profunda tristeza por serem esses os homens que produzem as matérias para que os jovens de hoje se informem a respeito de seus ídolos. Não é de se estranhar que esses mesmos jovens tenham a cabeça cada vez mais fechada.

Eu sinceramente nunca vi um fã de bandas como Black Sabbath, Led Zeppelin, Deep Purple, Rainbow, ou qualquer dessas bandas mais antigas, se batendo por causa de um novo integrante, massacrando impiedosamente um álbum diferenciado da banda, massacrando qualquer falha técnica, no centésimo show de uma turnê mundial, de uma pessoa que há quase um ano não tem contato com sua família.

É ridículo ver o quanto músicos, que já tem que lutar para ter seu lugar ao sol, sem o apoio da imprensa geral, concorrendo com outros estilos mais populares, são destruídos pela própria imprensa especializada. Haja vista o Helloween, que até hoje é criticado por uma mudança de vocalista, ou por convocar um novo guitarrista com estilo bem diferente dos anteriores. E vejam: falamos de ótimos músicos, que mostram talento e uma ótima técnica musical. Ou como tem acontecido com o Nightwish: até o presente momento a banda sequer lançou seu novo álbum, e a nova vocalista já está sendo criticada.

Naturalmente todos temos preferências, por estilos de música, por álbuns, e pelas canções que mais nos comovem. Isso não significa, em hipótese alguma, que as outras músicas que não fazem parte dessa seleta lista, sejam ruins ou mais fracas. Do mesmo modo, existem diversas técnicas para expressarmos o nosso talento artístico. Mesmo assim, muitos desses críticos baseiam-se exclusivamente na técnica clássica, onde o cantor tem que ter um vocal limpo, perfeito, e tender a ser um tenor ou um soprano, para que seja considerado bom. Do mesmo modo, um guitarrista é idolatrado por sua rapidez e virtuosismo técnico, para que seja considerado um músico digno do estilo. Que absurdo é esse? O rock foi criado como um estilo revoltoso em relação aos que existiam. Surgiu do blues, mas para dar ares mais pesados, mais agressivos, e mais distantes de toda a técnica e mesmice que existia.

Agora, um bando de pessoas que julgam-se entendidas sobre técnicas, estilos, arte e inovação, vêm colocar rédeas e correntes trancadas com cadeados no rock. E pior: no heavy metal, o estilo que mostrou uma revolta ainda maior em relação ao rock. Será que isso não é um tanto ridículo?

Essa é a nossa realidade. Não sei ao certo se isso é o que ocorre em todo o planeta, mas sei que muitos ainda pensam dessa mesma maneira. Infelizmente são essas pessoas ignorantes e de mentes fechadas que controlam os meios de comunicação. São essas as pessoas que contribuem para formar opinião de jovens. São essas as pessoas que estão ajudando a acabar com o heavy metal.

Felizmente, para nós, fãs do estilo, as bandas estão cientes dessa mentalidade, e continuam fazendo seu trabalho, independente de críticas e de opiniões, continuam criando legiões de fãs e lotando casas de shows. E felizmente, por ser esse ramo onde a revolta contra o padrão predomina, e onde a mídia está sempre contra, a maioria do público mantém-se fiel aos seus ídolos, independentemente da opinião de imprensa especializada ou de pessoas que julgam-se profundos conhecedores do assunto.

Obs: texto publicado no site “Whiplash”, no dia 15 de agosto de 2007.

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