sexta-feira, 8 de abril de 2011

O caos no judiciário


Dia 04 de maio completarei um ano como funcionário do Tribunal de Justiça de São Paulo. Neste ano, são dez meses fazendo horas extras, todos os dias, praticamente, praticamente oito meses substituindo a chefia, e um ano trabalhando como um condenado.
Ainda sou pouco experiente no assunto, mas já percebi que a coisa está totalmente degringolada no poder judiciário, no que concerne ao Estado de São Paulo. A defasagem de funcionário está na casa de 15.000. Ou seja, existem 15.000 funcionários a menos do que o necessário para prestar um trabalho de qualidade à população. A cada dois anos temos um concurso novo, onde são nomeados cerca de 2.000 pessoas, e mesmo assim, a defasagem é imensa. Por ano, o judiciário perde cerca de 800 servidores, mesmo com um bom salário, e com a estabilidade. As pessoas preferem pedir exoneração, seja para assumir cargos em outras esferas do judiciário, seja por não agüentarem o tranco.
O judiciário paulista tem quase metade do total de processos do país. A verba repassada pelo Governo Paulista, como ocorre há quase vinte anos, é de 4%, menos do que obriga a lei. A infra estrutura é precária, às vezes faltam materiais, falta ventilação, os prédios são antigos. Poucos funcionários, e muitos processos. A cada semana, no cartório que faço parte, são julgados mais de 300 processos. A média mensal é de cerca de 1.400 por mês. Mesmo assim, os acervos são imensos, e os seis desembargadores  praticamente não dão conta do serviço que recebem.
Os cartórios têm um rodízio imenso de funcionários. Cada servidores é responsável por uma quantidade incrível de atividades por dia. Via de regra, coisas urgentes, que envolvem a vida de muita gente, que precisam ser feitas com a máxima rapidez. Via de regra, os servidores não têm condições de atenderem todas as atividades que precisam, e muita coisa acaba ficando para depois. Todos os dias é assim, e todos os dias temos mais serviço acumulando, esperando um momento para ser feito.
Todos os dias existem milhares de processos para serem autuados (a média de entrada é de 2.000 por dia). Todos os dias centenas de petições são protocoladas, centenas de recursos são interpostos, e uma quantidade imensa de tentativas de conciliação são recusadas. Todos os dias milhares de liminares são concedidas, e os servidores têm que parar suas atividades para transmitirem por fax as decisões. Todos os dias muitos acórdãos, sentenças e despachos são publicados. Todos os dias muitos mandados e cartas são expedidas, assim como um número absurdo de ofícios. Todos os dias dezenas de advogados vão acompanhar os processos no balcão do cartório, todos de uma vez, sendo atendidos pelos poucos servidores que fazem parte do cartório, e todos os dias são obrigados a ficarem na fila para conseguirem o que querem.
Todos os dias um desembargador se irrita com erros cometidos pela secretaria, que está sobrecarregada, e não consegue dar conta do que tem pra fazer. Todos os dias um chefe toma uma bronca danada por causa disso, e não pode falar nada. Todos os dias este chefe fica estressado, e acaba ficando doente, ou descontando sua raiva na hierarquia mais baixa, os servidores.
Todos os dias alguém da direção é alterado, para tentar solucionar o problema. E todos os dias soluções mirabolantes são inventadas, tentando otimizar o trabalho e fazer com que os funcionários trabalhem ainda mais. E todos os dias, com isso, mais funcionários excedem seu limite, ficam exaustos, cometem erros, e acabam ficando doentes. E mais funcionários são criticados, tentando fazer com que acreditem que são incompetentes, quando cada um tem que trabalhar por três.
Todos os dias a mídia e o povo critica o judiciário. Todos os dias metem o pau nos servidores, sem ter qualquer noção do que ocorre num cartório e do que passa um funcionário para conseguir realizar o seu serviço mais ou menos bem. Todos os dias colocam a culpa da lentidão em quem tem processo em todas as calhas, em cima das mesas, no chão, nas portas, quase não conseguindo andar no cartório. E todos os dias se esquecem que seu dinheiro, pago em impostos, está sendo usado para pagar altos salários de deputados, senadores, governadores e todo tipo de político, enquanto o judiciário é deixado de lado. E todos os dias se esquecem que quanto mais educado for o povo, menos problema judicial existirá.
E todos os dias os problemas são os mesmos, os funcionários, ganhando bem, deixam o poder judiciário, ficam doentes, são tratados como lixo, todos os dias os advogados não conseguem executar o serviço direito, os chefes perdem a paciência, e os desembargadores e juízes não querem nem saber. Mas todos continuam votando nos mesmos nomes...

O perigo está ao volante


Ao longo da minha vida, sempre vi mulheres dirigindo. E sempre as considerei excelentes no ato. As mulheres sempre foram mais cuidadosas, mais medrosas, e menos letais. Sempre dirigiram devagar e sempre privaram pela vida. Enquanto isso, homens são mais habilidosos, correm como doidos, têm toda confiança em sua capacidade, e costuma se matar no trânsito, ou deixarem pedaços de seus corpos em cada esquina.
O grande problema é que esta realidade mudou. As mulheres têm ganhado cada dia maior habilidade, cada dia maior confiança, e têm se tornado tão ruins quanto os homens dirigindo. Andar no trânsito na maior parte das cidades e estradas do nosso país é uma verdadeira roleta russa. Se você for pedestre, como eu, o perigo é imensamente maior.
Estou desconfiado que a grande maioria das pessoas é daltônica, pois têm uma imensa dificuldade de entender a diferença entre as cores vermelhas e verdes, mesmo ambas sendo complementares. Não conseguem entender que as faixas brancas no chão não servem de enfeite, e sim para indicarem que seres humanos a pé, que não têm a mesma força de um carro, estão atravessando naquele ponto, e têm o direito de fazer isso. Também não entendem que as luzes que fazem parte de seu carro servem para alguma coisa, especialmente para dar dicas aos colegas de volante que algum ato será tomado.
É incrível o imenso número de animais que existem dirigindo carros hoje em dia. Parece aquele desenho do Pateta, antigo, de um cara legal, e todo certinho, que entra dentro do carro e vira um demônio. Homens e mulheres que parecem querer saciar sua sede de sangue quando engatam a primeira marcha, e parecem quererem se suicidar de maneira espetacular.
Esta semana uma moça grávida de 25 semanas morreu num acidente na Dutra, ao se envolver num acidente com caminhão, quando guiava sua moto. Que porra uma mulher grávida fazia pilotando uma moto? E o grande homem que guiava o caminhão, mostrando o quão homem é, fugiu, deixando a vítima e seu filho morrerem, sem qualquer ajuda.  Quantos covardes existem dia a dia? Quantas vítimas de imprudência ainda teremos que ver?
Eu hoje tenho uma opinião extremamente radical quanto a atos ilegais no trânsito. Creio que você atropelar e matar uma pessoa tem que ser considerado homicídio doloso, pois você tem toda consciência do mundo que está com uma máquina com capacidade de matar, e que se não tomar cuidado, pode tirar a vida de alguém. Se comete uma atitude imprudente, está assumindo o risco de matar alguém, portanto, mesmo que do nada uma criança atravesse na sua frente, você assumiu o risco de matá-la, ao estar acima da velocidade permitida.
Creio que alguns erros deveriam implicar na perda imediata da carteira, e na total proibição de se voltar a dirigir, por um longo tempo, dado o perigo de termos um ser destes nas ruas. Passar no farol vermelho, não dar preferência ao pedestre, estacionar em calçadas, fazer as curvas em alta velocidade, sem esperar que os pedestres atravessem, dirigir bêbado,etc. Todas situações que colocam em risco a vida de milhares de pessoas. Isso não pode ser mais tolerado. Apenas vamos punindo pessoas por matarem outras, e vendo o ato ocorrer de novo, e de novo, e de novo, e de novo... nunca nos cansamos.
Mas, obviamente que péssimos motoristas sendo punidos e perdendo suas habilitações implicaria em menos pessoas comprando carros, e mais indústrias de imenso porte obtendo seus lucros. E, obviamente, isso não interessa a quem tenha algum tipo de poder.

O monstro sem fim


Esta semana tivemos mais uma página triste, dentre tantas, na história do nosso país: o massacre de crianças numa escola no Rio de Janeiro, e mais tantas feridas. Um maluco, que invadiu uma escola, matou uma série de crianças, e se matou. Mais um dentre tantos casos, como os que matam a namorada porque ela terminou, ou que joga a filha pela janela, ou que esquarteja os filhos e os coloca em um saco de lixo. Um número sem fim de casos escabrosos que vêm fazendo parte de nossa rotina.
É uma realidade assustadora, e preocupante, onde começamos a nos questionar se realmente vale a pena colocar mais um filho no mundo, diante de uma realidade tão cruel e sem perspectivas, sabendo que a qualquer momento seu filho pode ser seqüestrado, violentado, morto... a qualquer momento você pode estar viajando de carro e um bêbado vir na contra mão em alta velocidade, e acabar com toda sua família, ou a qualquer momento você pode ser levado para um matagal com sua esposa, e esquartejado e jamais encontrado.
Mas o que me preocupa ainda mais nesta realidade é a mentalidade das pessoas diante de tais casos. Temos um crescimento impressionante do “datenismo”, onde o que se busca é vingança. Queremos a morte dos assassinos. Queremos que eles queimem no inferno quando já estão mortos. Queremos o sangue como forma de justiça. Em nenhum momento buscamos entender o que está acontecendo com o mundo.
Considerar que este ser era um monstro e que merece ser destruído, é fácil, e normal. Podemos matá-lo, assim como podemos executar os Nardoni e todos os casos parecidos. Podemos linchá-los, jogá-los aos leões. Mas quanto tempo levaria para que surgissem novos monstros que cometeriam atos ainda mais bárbaros? Quanto tempo até que mais crianças fossem assassinadas? Quanto tempo até que mais pais matassem seus filhos? Quanto tempo até que namorados inconformados tirassem a vida de suas ex-namoradas, ou que as mesmas arranquem o braço do seu ex? Será que é uma tarefa tão difícil assim tentar entender o que está acontecendo, para que possamos tentar acabar com o problema de uma vez?
Entender a mente dessas pessoas não é um ato de bondade, misericórdia, ou de apoio aos direitos humanos. Entender tais mentes é buscar uma solução para o problema. Tentar impedir que atos como estes aconteçam, para que não precisemos lamentar e desejar vingança. Saber o que levaria uma pessoa a perder completamente a noção de valores, a ponto de matar crianças é entender o que pode levar um ser humano ao seu limite, para que possamos transformar possíveis monstros e pessoas normais.
Precisamos mudar. Mudar a maneira como vivemos em sociedade, mudar a maneira como entendemos os diferentes. Mudar a maneira como enxergamos um problema, tentando ver o todo, e não uma pequena parte. Sentir ódio é normal de qualquer ser humano, mas não vai mudar os fatos. As crianças não vão voltar à vida, as famílias não deixarão de sentir a dor que sentem, e assassinos não deixarão de surgir a cada dia.
As pessoas canalizam sua ira, mas não percebem que todos têm culpa destes atos contínuos. Todos criamos assassinos a cada dia, e erguemos uma série de perigos para os nossos próprios filhos.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Um grande homem


Meados de 1993, não lembro ao certo o mês, menos ainda o dia (na verdade, só sei o ano depois de fazer alguns pequenos cálculos). Sala de aula, 6ª série. A professora acabava de me trocar de lugar, me colocando na terceira carteira, na fileira do meio. À minha frente, um cara muito alto mesmo. Para piorar, o cara estava vestido com uma jaqueta que mais parecia um bote inflável. Eu tentei desviar para todos os lados, ficar de pé, virar para os lados, eu simplesmente não conseguia enxergar o que estava escrito na lousa. Então cutuquei o cara, e quando ele se virou pra trás, pedi licença para que pudesse copiar a lição do dia. Aquele foi o começo de uma grande e verdadeira amizade.
Foi assim que eu conheci o Igor. Depois daquilo, começamos a estar no mesmo grupo, e começamos a conversar mais. Disputamos alguns campeonatos de vídeo game na casa do Rignaldo, e então comecei a freqüentar a casa dele. Em pouco tempo, fizemos parte de um dos piores times da história, jogando bola de fim de semana no Bradesco.
Com o tempo a amizade foi ficando mais forte: eu, o Igor, André, Rignaldo, Nivaldo e Gallo. Com o irmão do Igor, Gustavo, outro grande amigo, passamos a jogar truco na frente da casa dele, ficarmos até tarde da noite conversando e assistindo filmes, de vez em quando indo para alguma balada furada inventada pelo Nivaldo, sem um tostão. Era um tempo incrível.
E a cada dia eu e o Igor tínhamos mais afinidade: em pouco tempo estávamos viciados em rock. Amamos futebol, e jogávamos futebol no vídeo game o tempo todo. Formamos uma dupla imbatível no FIFA, com direito a xingos, gritos e pulos no sofá. Várias noites dormidas na casa dele, várias baladas rock ´n´ roll. A inesquecível viagem para a Praia Grande, quando o Igor ficou puto com o Alessandro por causa da pasta de dentes, a época em que o André pagou o curso para o Igor, num momento de extrema dificuldade, os desabafos dos meus intermináveis problemas familiares... foi tanta coisa que vivemos, que não da pra dizer. E o mais legal de tudo é que o Igor sempre foi o cara que fez de tudo para que eu me entendesse com meus pais e com minha irmã. Sempre foi o cara que queria a paz, para todos.
Na época do meu namoro com a Joyce, foi o cara que mais me ajudou, e me incentivou a me libertar. Ouvia todas as minhas lamentações, e toda minha raiva. Me xingava por não entender como eu ainda estava com ela, com tudo o que acontecia. Mesmo assim, sempre a tratou bem.
Mas foi no momento mais difícil da minha vida, que pude perceber o que representava a amizade com este grande homem (1,90m é um tamanho e tanto!). Mergulhei no inferno, estava no meio de um tratamento terapêutico, briguei feio com meio pai, saía de casa... ele, numa reação que poucos teriam, me abrigou na sua casa, juntamente com sua família. O cara sustentava a mãe, a vó, os irmãos, sobrinhos, cachorro... era um incansável que lutava bravamente. E mesmo assim, me aceitou por lá.
Eu estava tentando me reencontrar na vida, ainda perdido, mas com muita vontade de mudar minha história. Arrumei um trabalho medíocre, e ganhava pouco mais de R$320,00 por mês. Quase não conseguia ajudar na casa. A avó ficou com ciúme, de vez em quando a mãe também. O cara ouviu até a alma por minha causa, e mesmo assim, fez de tudo para que eu continuasse lá. Eu fiquei sabendo disso apenas no final da minha estada na casa dele.
Quando me dei conta do ocorrido, perguntei por que ele fez tanto pra que eu ficasse lá. Ele me respondeu que sabia que eu tinha tudo pra decolar na vida, mas só precisava de um pequeno empurrãozinho. Eu creio que ele não me deu este empurrão, creio que foi realmente a pessoa que me carregou no colo quando eu não queria mais andar.
São momentos que eu jamais irei esquecer, e jamais irei retribuir, pois nunca conseguirei chegar aos pés do que ele fez por mim. Hoje eu sou um vencedor, e muita gente me ajudou ao longo desta caminhada, alguns mais do que deveriam, mas o que este grande homem fez por mim, não há como expressar em palavras. Foi a prova viva de que todas as pessoas estava erradas, e que realmente na vida temos amigos verdadeiros, que na hora que mais precisamos, são os que irão realmente nos ajudar.
O que sempre nos deixava muito tristes, é que o cara buscava uma companheira de verdade, não uma aventura. Se mostrou o cara perfeito, não queria farra. E sempre escolhia errado... isso o deixava mal, e nos deixava mal...
Até que apareceu a Rachel. Em pouco tempo, os pequenos defeitos desse cara sumiram, e ele se transformou na representação viva da felicidade. Naquele momento eu realmente acreditei que existia justiça no mundo. E para variar, este cara deu mais uma demonstração que só ele seria capaz: mesmo de pé quebrado, foi à igreja se casar, de muleta e tudo. Era o que ele mais queria naquele momento, era uma prova de amor que só o Igor seria capaz de dar.
Um homem honesto, extremamente trabalhador, que como sempre disse o André, se jogava no chão para os outros pisarem em cima, se isso fosse ajudar, sempre muito sincero. Um marido dedicado, que sempre mostrou que não existe nada mais importante do que sua amada esposa. Um exemplo de ser humano que não se vê hoje em dia. E que recebeu no dia quatro de abril de dois mil e onze, a máxima coroação: nasceu sua filhinha, Ana Beatriz. Acho que mesmo eu poderia considerar um presente pelo que este homem é, e pelo bem que faz ao mundo.
Não sei exatamente qual será o futuro dessa linda mocinha, nem que carreira vai seguir, com quantos anos vai casar, etc. Mas tenho a mais absoluta certeza que sua vida já começa da melhor forma possível, pois ela já nasce tendo perto de si um exemplo incomparável de homem.
Em resumo: um dos melhores amigos que um homem pode sonhar em ter.