domingo, 9 de maio de 2010

Futebol: um convite a deixar de estudar


Ouvi alguns comentaristas esportivos dizerem que jogadores de futebol merecem ganhar os salários que ganham. Os mesmos proporcionam espetáculos para multidões, envolvem patrocínios milionários e trazem milhões de lucro ao espetáculo, e por isso merecem o que ganham. Alguns ganham mais de R$500.000,00 por mês, jogando futebol. É bem verdade que exige disciplina, concentração e muito treino. Mas será mesmo que merecem tanto?
Como exemplo, falarei de mim e da minha noiva. Eu sou formado em Artes Plásticas. Pagava em média R$500,00 por mês na faculdade, o que conseguia somente com a ajuda do meu pai, pois minha carreira é um tanto quanto fechada para oportunidades imediatas. Tive que trancar a matrícula por dois anos, por falta de dinheiro. Gastava com condução, livros, materiais, etc. Quando terminei a faculdade, tive muita dificuldade em conseguir empregos. Fiz entrevistas em museus, mas não obtive sucesso. Consegui algumas aulinhas, até ser aprovado no concurso para professor do Estado. Hoje, ganho R$1500,00 para trabalhar com 26 aulas semanais, mais duas horas de reuniões obrigatórias, e o óbvio trabalho extra classe. Logo irei remar para um trabalho de nível médio, porque conseguirei um salário melhor, de R$2.700,00.
Minha noiva, nutricionista, gastou ainda mais com a faculdade: em média R$650,00 ao mês. Mais condução, alimentação, livros, etc. Como nutricionista responsável pela merenda escolar do Estado de São Paulo, ganha cerca de R$1.600,00 para uma jornada de 40 horas semanais. Além disso, ela é responsável pelo controle de qualidade da comida, uma baita responsabilidade. Ela andou vendo como está o mercado, e a base salarial anda ainda menor, com empregos que misturam a nutrição com vendas.
Imagino que tenhamos zilhões de exemplos como estes. Pessoas que gastam muito dinheiro com estudos, investem tudo em suas carreiras, se dedicam, e ganham um salário apenas para sobrevivência, enquanto jogadores de futebol,  que mexem apenas com entretenimento, e muitas vezes não têm sequer o ensino fundamental concluído, ganham fortunas por mês.
Esta disparidade retrata bem o que é o pensamento brasileiro: estudar pra quê? Uma profissão tão idolatrada, onde o que conta muitas vezes é ser malandro, é algo bem mais vantajoso do que pegar um bom livro pra ler. Você não precisa ser um bom aluno, não precisa respeitar os professores, não precisa se preocupar com nada, apenas ter habilidades futebolísticas.
E o pior são estas pessoas com o poder que lhes é dado pela mídia, defendendo este absurdo. Cada dia mais e mais pessoas se interessam menos pelos estudos por causa desta situação. E muitas se desiludem, pois não é a maioria dos jogadores que consegue chegar a esta valor salarial. A maior parte ganha salário mínimo, quando muito.
Não defendo que os jogadores devam ganhar mal, mas não vamos exagerar. Os salários poderiam ser altos, mas existem profissões infinitamente mais importantes que são muito desvalorizadas. Isso é distribuição de renda, refletindo o que o país considera importante e quais as diretrizes que vai tomar para o futuro. E pareça que as do Brasil não andam muito bem das pernas...

Nenhum comentário:

Postar um comentário