sábado, 26 de maio de 2012

Por que direito?


Me formei em 2007 em Artes Plásticas. No mesmo ano, fui aprovado no concurso de Escrevente do TJ de São Paulo, sendo nomeado em 2010. Tenho um salário razoável, suficiente para viver com um mínimo de conforto, um bom reconhecimento dentro do cartório onde estou lotado, comprei meu apartamento, um bom conhecimento sobre algumas coisas, tenho meu carrinho e uma ótima companheira. Em geral, para uma vida feliz, tenho tudo o que eu preciso.
Mesmo assim, já com mais de trinta anos, e sendo pressionado por um filho, resolvi estudar direito. Obviamente isso poderá me trazer benefícios, como prestar concursos melhores, ser convidado para gabinetes, etc. Mas em cinco anos muita coisa pode acontecer, e mais do que nunca, nem sei se estarei vivo até lá. E em geral, eu não preciso disso para levar uma vida feliz. Não preciso disso sequer pra garantir meu emprego. Posso dizer que, se quiser me encostar hoje, já tenho minha vida garantida.
Mas eu decidi que seguiria este ramo há mais de um ano. E desde que comecei a estudar para os concursos jurídicos, fiquei fascinado por este ramo tão formal e técnico, que segrega tanto as pessoas, e em geral, é o extremo oposto do que eu prego e sigo. Estou dormindo pouquíssimo, gastando uma nota preta em livros e mensalidade, e ainda por cima tendo que trabalhar com mais intensidade para repor o que fazia no tempo integral, pra cursar uma faculdade que eu não preciso. E por quê?
Primeiramente, porque o conhecimento jamais irá ocupar espaço na mente de qualquer pessoa. E mais do que receber conhecimento vindo de livros, o que sempre será algo indispensável, estou recebendo conhecimento de pessoas que estudaram bastante e que estão aptas a falar com propriedade sobre determinados assuntos que eu penaria pra entender sozinho. Além do fato de trocar experiência com pessoas que buscam o mesmo conhecimento que eu, mesmo que por motivos diversos.
Mas o mais importante, não há como se buscar justiça se não conhecemos sequer as leis que os regem. Não há como exigir ou se revoltar contra alguma coisa, se não temos uma base mínima para saber por que iremos gritar. O conhecimento das leis é indispensável, e deveria ser ministrado desde os primeiros anos do ensino básico. Conhecer a lei é dever de todo cidadão, para que haja como um verdadeiro cidadão.  Sem a lei não há justiça.
E conhecer a lei é necessário, para que a mudemos, quando ela é contrária a toda moral e toda ética que julgamos a melhor para a vida em sociedade. Mas não só a lei, como tudo aquilo que a cerca, e que a construiu. Conhecer a lei é conhecer a história. E conhecer a história é entender o que nos fez chegar até aqui, onde erramos, onde acertamos, e o que poderíamos fazer de diferente.
Estudar o direito é ter a possibilidade de peitar este sistema, que trata as pessoas de maneira tão desigual, dando privilégios para certas classes, deixando outras na miséria. É lutar contra textos tão técnicos, que se distanciam da população. É saber do que se fala e onde pode-se exigir mudança.
Estudar direito é saber que as pessoas têm o direito de serem ouvidas, têm o direito de se revoltarem contra o que está errado, têm o direito de exigir uma vida melhor, um trabalho melhor, melhores condições de trabalho, e uma recompensa que lhes dê condições de sobreviver minimamente bem. Estudar direito é saber que a vida em uma comunidade exige que se respeite os direitos de todos, e que se faça sacrifícios para que todos tenham seus direitos respeitados. E que não é fazer a vontade da maioria, quando esta vontade trará sofrimento desmedido para alguns, mas ser justo o suficiente para minimizar o sofrimento de todos, sem que uma minoria pague caro demais por isso.
Estudar o direito é ter posse da maior arma social que temos alcance. É o necessário para fazer o que é certo. Propagar este conhecimento é a única forma de conseguir um futuro melhor. Aceitar o que é certo, mesmo que isso nos tire da nossa zona de conforto. Por isso eu decidi viver cinco anos de cansaço extremo, de muito estudo, e de uma mulher um pouco insatisfeita, por ter que esperar mais cinco anos pra realizar o desejo de ser mãe. Mesmo não precisando profissionalmente, e mesmo sem certezas de que isso um dia irá me trazer algum tipo de evolução funcional.

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