segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

AS AMIZADES E A DISCORDÂNCIA


Quando eu ainda era adolescente, cansei de receber e-maisl religiosos da maioria dos meus contatos, mandando bênçãos e palavras de deus pra mim, e pedi, naquela época ainda de maneira bastante educada, que parassem de me enviar tais mensagens. Lembro que meu tio ficou puto da vida, falou que eu era só uma criança assustada querendo atenção e que não respeitava os outros. Respondi ainda com bastante educação, tivemos um debate bem leve, e depois passou. Apesar desta discordância, nunca tive qualquer raiva dele, nem cogitei parar de falar com ele.
Ainda em relação a ele, tivemos bastante discussões sobre políticas, sendo ele filiado ao PSDB e eu um crítico do partido. Muitas vezes ele me chamou de iludido, de acreditar em tudo que mídias revolucionárias de esquerda diziam. E eu devolvi falando sobre os problemas sociais que o partido dele impôs ao país. Apesar de serem discussões acaloradas, e nenhuma das partes mudar de posicionamento, nunca deixamos de nos falar por causa disso.
Eu vi muitos amigos ao longo dos tempos discutindo sobre a veracidade de teorias católicas contra as teorias evangélicas. Os debates em geral partiam para as ofensas e uma raiva desmedida de ambos os lados. Apesar de disso, não me lembro de ter visto um crente ter cortado relações com um católico por causa disso.
Em 2003 tive uma série de discussões com minha então namorada, Joyce, porque ela era evangélica e eu ateu. Cheguei a brigar com a família dela porque eles me julgaram sem nunca terem me visto. Naquela época fiquei tão puto da vida que fiz ela escolher entre a igreja e eu. Hoje sei que fiz uma baita duma cagada, pois deveria ter respeitado esta diferença, e provado na prática que eles estavam errados. Fui levado pela emoção, pela inexperiência e pela raiva, e acabei por cortar relações com aquelas pessoas por causa de religião, algo que me arrependo até hoje.
No mesmo período do meu namoro com a Joyce, recebi muitas críticas, muitas mesmo, da tia dela, Iranides, uma das melhores pessoas que conheci na vida. Nenhuma delas ofensiva, mas todas tentando mostrar o quanto meu ponto de vista estava errado. Nunca concordei com ela, mas ela continua sendo uma das minhas melhores amigas até hoje. E a irmã dela, Geni, foi uma das minhas madrinhas de casamento (não com a Joyce, é claro!).
Cerca de uns quatro ou cinco anos atrás, meu melhor amigo, Igor, me disse que tinha se convertido para religião protestante, frequentando a igreja universal. Não sei se dei minha opinião a respeito, mas jamais tivemos um princípio qualquer de discussão, debate ou comentários sobre o assunto. Ele hoje é evangélico praticante, e eu ateu também praticante, e somos amigos, irmãos, e acredito piamente que sempre seremos.
Ao longo da minha vida tive sérias discussões com minha mãe por causa de religião. Não só com ela, mas com toda a família dela. Eles sempre tentaram me mostrar que não haveria como fugir das religiões e que eu acabaria tendo que recorrer a ela um dia. Tivemos brigas de família sim, mas jamais por causa de religião. E hoje nosso relacionamento é perfeitamente normal.
Tenho uma imensa riqueza de exemplos de discordância com pessoas. Como fã de heavy metal, tenho grandes amigos que nem de rock gostam. Como ateu, meu melhor amigo é evangélico, e minha esposa é totalmente temente a deus. Como amante de gatos, tenho amigos que nem sequer gostam de bichos. Como ideologicamente de esquerda, tenho familiares e conhecidos que são filiados ao PSDB ou que acham o comunismo uma merda. Como artista plástico, tenho amigos que são incapazes de compreender o brilhantismo de Jackson Pollock.
Vivo discordando de todo mundo. Não consigo aceitar algumas coisas que não fazem sentido só porque as pessoas acham normal. E cada vez mais sinto uma necessidade grande de gritar isso aos quatro ventos. Da mesma forma que as pessoas que discordam de mim vivem pregando suas ideias e suas críticas, acho que temos o direito e o dever de mostrar o outro lado da história. Nunca imaginei que as pessoas que pregaram o oposto do que eu penso querem aparecer ou humilhar os outros. Apenas entendo que estão espalhando seu ponto de vista.
Mas agora enfrento uma situação diferente. Fui excluído praticamente da vida de dois amigos por causa da minha atuação dentro de ideias religiosas e pela minha crítica política. Duas pessoas que não suportaram ser contrariadas, ou que não tinham condições de encarar um debate. E no acesso de fúria, fizeram o que eu fiz com a família da Joyce.
Soube que existe até uma discussão por minha causa em páginas que eu não consigo visualizar. E as pessoas continuam putas da vida porque minha opinião é “um desrespeito” ao que acreditam. Discordo mais uma vez, e vou debater pelo que acredito seja certo. E acho saudável e absolutamente normal uma pessoa discordar de mim, criticar, expor o que pensa. Não vou ficar com raiva disso.
Não acredito que respeitar o próximo seja ficar calado diante de tudo aquilo que você não acredita, ou sorrir falsamente quando você está enfurecido com o que está sendo dito. Acredito que respeitar o próximo seja aceitar que ele tenha um ponto de vista diferente do seu e que pode expressá-lo quando achar que deve fazer. E respeitar o próximo também não é deixar de discutir quando você julga correto, e sim discutir, com o maior vigor possível, mas saber que aquilo é pura e simplesmente uma troca de ideias e que a democracia se faz assim.
Por fim, deixo aqui meu mais sincero voto de admiração para meu amigo Rodrigo Reis, que travou uma sequência épica de discussões comigo, chegamos a exaltar os ânimos várias vezes, uma vez ou outra até xingando, mas agimos como HOMENS agem, que travam esta guerra ideológica, contestam seu adversário, mas não deixam que isso risque uma amizade, mesmo que ninguém modifique seu ponto de vista. Esse é o tipo de cara que agente tem que admirar de verdade na vida.

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