segunda-feira, 19 de novembro de 2012

OS DIAS DE NOSSAS VIDAS


Nove meses. Este foi o período em que tivemos que passar pelo purgatório. Não um período pra sobreviver, mas para reaprender a viver. Na verdade, se algum dia alguém conseguir me convencer que existe algum inferno, acredito que ele será algo bem próximo do que vivi nestes últimos meses.
É difícil sequer entender como a vida da este tipo de cambalhota. Você planejar cada passo, pensar meticulosamente as reações, maneiras de emocionar as pessoas que você ama, e de repente o mundo muda. Todo seu planejamento é destruído em cinquenta minutos, como se seu esforço não valesse nada.
E você entende que basicamente não há justiça no mundo. Pessoas boas e honestas são castigadas por coisas que não fizeram. Recebem castigos que não merecem. Uma família linda é destruída num piscar de olhos, sem qualquer razão pra isso.
Foram nove meses de profunda revolta, estresse, nervoso, e até mesmo um desejo de jogar tudo pra cima, e admitir que desta vez as forças não foram suficientes para virar o jogo. Não porque eu não quisesse, mas porque aqueles que tinham o poder de mudar o rumo da partida simplesmente pareciam não querer fazê-lo.
Nestes meses eu terminei completamente com minhas pequenas dúvidas sobre a existência de Deus. É óbvio que esta ideia não passa de ficção barata. E sim, me revoltei com as pessoas que se apegam a esta bobagem como esta fosse a resposta para a vida, mas que no fundo mergulhavam em depressão, desistiam e descontavam sua fúria nos outros. E descarreguei intencionalmente minha raiva nesta ideia patética de deus, talvez até mesmo como meio de catalisar minha raiva. E sim, isso me deu muito prazer.
E acreditem: passar pelo purgatório faz com que você reveja sua vida. Até porque eu não vou recorrer a deus pra nada (e aqueles que acreditavam tanto que nas horas mais difíceis eu iria acreditar, perderam duas oportunidades, hein?). Eu sempre soube que as forças vinham de mim. Não adiantava esperar um milagre.
Mas devo admitir, poucas coisas na vida realmente me abalaram tanto quanto ver a pessoa que eu amo cair tanto, desistir tão facilmente, e me tratar como se eu fosse culpado pelos problemas. Não da pra descrever quantas feridas ficaram por conta disso. E eu admito: eu cheguei a desistir. Em determinado momento, não tinha mais vontade, paciência, e principalmente, forças pra continuar nessa situação.
Mas parece que neste momento ela começou a reagir. A subida foi penosa, sofrida e sem nenhum prazer. Apesar da alegria em ver que ela estava andando de novo, vinha um enorme medo de que ela não fosse ter forças pra conseguir. E eu entendi que provavelmente eu também estava contaminado. A sensação de injustiça vivida, de ser responsabilizado, de não ser forte o suficiente... a sensação de impotência, a pior coisa que um ser humano poderia sentir, são feridas que ainda não cicatrizaram suficientes.
E sim, hoje eu me sinto um homem mais “frio”. Me sinto menos tolerante com discussões idiotas, com pessoas nervosas por motivos banais. Me sinto menos interessado em trabalhar arduamente, porque a vida acaba num segundo, e você não consegue curtir aquilo que plantou a vida toda. Me sinto mais impaciente para falar sobre deus, que nunca faz nada por ninguém.
Mas eu lembro do filme “Jamaica Abaixo de Zero”, e me sinto um vencedor. Não aquele cara que ganha o primeiro lugar na corrida, mas o cara que consegue trazer o carro quebrado, com a perna quebrada num acidente, e ainda doente. E mesmo assim consegue chegar, e mostrar que, se quiserem te derrubar, melhor que parem de agir de maneira tão amadora.
Superar um desafio desses não da uma sensação apenas de alívio, e sim uma sensação de total orgulho. E não porque o nosso ego pede isso, mas porque ainda assim eu fui capaz de manter meu caráter inabalável. Mesmo com alguns deslizes, fui capaz de resistir à terrível sensação de desistir. Mesmo com a dificuldade e o sofrimento que me era causado, consegui aguentar as pontas, e tentar compreender o que estava sendo vivido, quais emoções estavam em jogo, e porque as coisas estavam ali.
Mesmo com a sensação de rejeição e de raiva, consegui resistir às tentações, e não me manter fiel a uma pessoa, e sim à minha palavra e ao meu caráter. E eu sei que algumas pessoas não seriam capazes de me trazer um copo d´água se eu estivesse morrendo de sede, mas eu continuo sendo capaz de levar água até elas se elas precisassem disso.
E depois desses tortuosos nove meses, me sinto feliz nesse dia 21 de julho. Feliz por ter sobrevivido a tudo. Não intacto, mas sobrevivido. Às vezes até sem força alguma. Feliz por ver a pessoa que eu amo conseguir se colocar de pé novamente, e começar a tentar seguir nessa corrida, muitas vezes sem nenhum sentido. E feliz por saber que, por pior que este mundo seja, eu não preciso ser igual a ele. E muito feliz por estas vivendo estes dias de nossas vidas.

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