domingo, 9 de fevereiro de 2020

O GRANDE PARASITA


Em 2004 estava no auge da minha depressão. Desempregado, tive que parar a faculdade de artes que eu cursava naquele momento. Resolvi me arriscar nos concursos públicos. Comecei pra escrevente. Um amigo me ajudou, mandando todos os artigos de lei que cairiam na prova. Estudei feito um doido, partindo do zero. Toda hora ligava pra esse cara tirando dúvidas do “juridiquês” totalmente maluco naquele momento pra mim. Ouvi um monte de gente dizendo que era besteira, muita gente concorrendo, que eu não tinha preparação, não ia passar.
Ao final da prova, fiquei entre os classificados para a prova de digitação. Cerca de 3000. Consegui a aprovação total. Mas existia um problema no edital, pelo fato de enxergar com um olho só me colocaram como deficiente visual, e isso deu um rolo danado, sendo que acabei eliminado. Poderia ter recorrido, e vi que ganharia o processo. Mas estava muito mal psicologicamente pra pensar nisso. O fato é que eu passei.
Em 2007 tentei de novo. Estudei ainda mais, nesse momento juntamente com a prova de professor de artes do Estado. Consegui ser aprovado em ambos. Em 2009 prestei o concurso pra professor de artes do Município de São Paulo. Uma prova dificílima, conceitual, que levava o dia inteiro. Nesse acabei em 50º lugar, também aprovado.
Em abril de 2009, enquanto já era professor do Estado, nomeado na primeira chamada, fui nomeado professor da prefeitura, e escrevente técnico, vindo do concurso de 2007. Sim, sem um diploma de direito, contra 105.000 pessoas, eu consegui. Fui nomeado. Contra todas as possibilidades, todas as pessoas, e todos os problemas, eu venci essa batalha.
Ainda consegui algumas coisinhas aqui e ali em concursos, apesar de ter prestado poucos. Em 2018, quando meu filho nasceu, resolvi prestar o concurso pra Analista do TRT. Estudei feito um doido, inclusive comprando briga com a mãe dele, pois a partir de então não poderia mais dar atenção pra ele enquanto não tivesse a prova. Foi um estresse desgraçado. Nesse resolvi me inscrever na cota de deficiente, já que tenho o problema com a visão. Passei em 18º lugar na lista especial. Até agora foram nomeados seis dessa lista, sendo que estou no aguardo, sem tanta esperança. Mas também passei.
Sou servidor público desde fevereiro de 2008. Doze anos nessa brincadeira. E não é algo muito simples. Os planos de carreira são muito engessados. Existe uma pequena evolução por tempo, mas a diferença salarial é tão irrisória que nem percebemos. E não há muita evolução em termos de cargo. Você pode se tornar chefe e daí seguir nesse sentido hierárquico. Se não gosta dos postos de comando, não há muito pra onde ir.
Tanto na educação quanto no judiciário a falta de pessoas para o trabalho é notória. Há uma quantidade absurda de serviço. Via de regra cada servidor faz trabalho de três pessoas. Isso significa que ou o não da conta, ou faz com tanta pressa que erros ocorrem. Não há como sair disso.
Nas demais áreas a situação é parecida. Pouca gente, muito trabalho, muito desse trabalho urgente. Salários apenas razoáveis e pouca evolução. A grande maioria, depois de um tempo atuando, começa a ficar desanimada. A coisa é sempre enxugar gelo e sempre ouvindo críticas e mais críticas, sempre ao servidor, nunca ao gestor que deixa a situação em total abandono.
Muitos trabalham de saco cheio. Muitos, muitos mesmo, ficam doentes. Eu mesmo já tive problemas de estresse, ansiedade, enxaqueca, muito relacionados ao trabalho. Já briguei com colegas e chefes pela situação do trabalho. Já bati boca com desembargador até. Mesmo assim, o trabalho que exerço está sempre muito próximo de manter-se em dia. Tenho uma produtividade alta, com índice pequeno de erros.
Um cara que conheço, dos mais babacas, que adora meter o pau em servidor público, dizendo que é vagabundo e não gosta de trabalhar, diz que eu sou exceção. Cortei totalmente laços com esse trouxa, justamente porque não sou. A grande maioria dos servidores tira leite de pedra. Com a falta de material, de estrutura, e principalmente, de pessoal, faz muito além do que seria possível, sem grande recompensa. Passa nervoso o tempo todo por querer fazer algo melhor, e não conseguir.
Temos a estabilidade, como muitos dizem. Mas infelizmente o motivo disso não é lá muito divulgado. A ideia é não ficar à mercê do partido que estiver no poder. Nossa submissão é apenas com o trabalho a ser executado, não importa quem determine. E sempre de acordo com a lei, o interesse público, e as possibilidades. Um governo altamente perigoso, autoritário e ideológico, como o que ali está, não tem o poder para oprimir nem obrigar nenhum servidor a fazer o que eles querem. Se não tivéssemos a estabilidade, estaríamos recolhendo livros de escolas, proibindo desenhos de beijo gay, arquivando ou ignorando ações contra milicianos...

O ministro da defesa, Paulo Guedes, disse, de forma bem clara, que os servidores públicos são parasitas do Estado. Vamos lembrar que este ser ganha R$30 mil por mês, tendo zilhões de assessores. Foi um dos membros do governo Pinochet, a ditadura mais sangrenta da América Latina, sendo responsável pela equipe econômico, cujas ações aumentaram vertiginosamente a desigualdade social no país, levando a essa revolta extremamente violenta que colocou o governo de joelhos.
Guedes também lucra com o nada. Um verdadeiro especulador, que ganha dinheiro com bolsa de valores. Aquele negócio que vende e compra ações. Ações, pra quem não sabe, é basicamente, o nada. Você vende e compra o tempo todo ideias, que podem enriquecer ou destruir uma empresa, com papeis que não existem, um dinheiro basicamente fictício, que determina os rumos de um país.
Paulo Guedes também tem algumas investigações e acusações em curso, sobre fraudar informações para lucrar com a crise. Algumas paradas atualmente por causa do foro privilegiado, devido ao cargo que ocupa, algo que esses servidores parasitas que ele diz não têm.
Um ser repugnante, desprezível, altamente elitista, que acusa o pobre responsável por ser pobre, que queria impor um reforma previdenciária absolutamente desastrosa (em partes barrada pelo Congresso), culpado pela situação no Chile. E agora elege como inimigo o servidor público. Porque pra esse ser desprezível é importante aniquilar os direitos dessa classe pra beneficiar totalmente o setor comercial que trará lucros para ele.

Paulo Guedes é o próprio retrato do elitismo. É a personificação da concentração de renda, da desigualdade. É o que faz com que o pobre seja pobre, e cada vez mais pobre, e o rico cada dia mais rico. É o próprio parasita que descreve, assim como todo e qualquer integrante desse governo nitidamente nazista que de forma insana o brasileiro colocou ali.
É declarado inimigo do servidor público. Assim como do aposentado, do pobre, e provavelmente, assim que esses grupos foram derrotados, outros virão. Paulo Guedes, conforme descrevi em texto anterior, é o ser mais perigoso do governo. O cara que deve a todo custo ser derrotado pra não mais se levantar. É o inimigo total. E todos aqueles que o apoiam devem ser considerados também inimigos a serem vencidos. Paulo Guedes é uma ameaça para qualquer pessoa que não esteja limpando a bunda com notas de R$100.


Um comentário: