Quando eu ainda era adolescente,
cansei de receber e-maisl religiosos da maioria dos meus contatos, mandando
bênçãos e palavras de deus pra mim, e pedi, naquela época ainda de maneira
bastante educada, que parassem de me enviar tais mensagens. Lembro que meu tio
ficou puto da vida, falou que eu era só uma criança assustada querendo atenção
e que não respeitava os outros. Respondi ainda com bastante educação, tivemos
um debate bem leve, e depois passou. Apesar desta discordância, nunca tive
qualquer raiva dele, nem cogitei parar de falar com ele.
Ainda em relação a ele, tivemos
bastante discussões sobre políticas, sendo ele filiado ao PSDB e eu um crítico
do partido. Muitas vezes ele me chamou de iludido, de acreditar em tudo que
mídias revolucionárias de esquerda diziam. E eu devolvi falando sobre os
problemas sociais que o partido dele impôs ao país. Apesar de serem discussões
acaloradas, e nenhuma das partes mudar de posicionamento, nunca deixamos de nos
falar por causa disso.
Eu vi muitos amigos ao longo dos
tempos discutindo sobre a veracidade de teorias católicas contra as teorias
evangélicas. Os debates em geral partiam para as ofensas e uma raiva desmedida
de ambos os lados. Apesar de disso, não me lembro de ter visto um crente ter
cortado relações com um católico por causa disso.
Em 2003 tive uma série de discussões
com minha então namorada, Joyce, porque ela era evangélica e eu ateu. Cheguei a
brigar com a família dela porque eles me julgaram sem nunca terem me visto.
Naquela época fiquei tão puto da vida que fiz ela escolher entre a igreja e eu.
Hoje sei que fiz uma baita duma cagada, pois deveria ter respeitado esta
diferença, e provado na prática que eles estavam errados. Fui levado pela
emoção, pela inexperiência e pela raiva, e acabei por cortar relações com
aquelas pessoas por causa de religião, algo que me arrependo até hoje.
No mesmo período do meu namoro com a
Joyce, recebi muitas críticas, muitas mesmo, da tia dela, Iranides, uma das
melhores pessoas que conheci na vida. Nenhuma delas ofensiva, mas todas
tentando mostrar o quanto meu ponto de vista estava errado. Nunca concordei com
ela, mas ela continua sendo uma das minhas melhores amigas até hoje. E a irmã
dela, Geni, foi uma das minhas madrinhas de casamento (não com a Joyce, é
claro!).
Cerca de uns quatro ou cinco anos
atrás, meu melhor amigo, Igor, me disse que tinha se convertido para religião
protestante, frequentando a igreja universal. Não sei se dei minha opinião a
respeito, mas jamais tivemos um princípio qualquer de discussão, debate ou
comentários sobre o assunto. Ele hoje é evangélico praticante, e eu ateu também
praticante, e somos amigos, irmãos, e acredito piamente que sempre seremos.
Ao longo da minha vida tive sérias
discussões com minha mãe por causa de religião. Não só com ela, mas com toda a
família dela. Eles sempre tentaram me mostrar que não haveria como fugir das
religiões e que eu acabaria tendo que recorrer a ela um dia. Tivemos brigas de
família sim, mas jamais por causa de religião. E hoje nosso relacionamento é
perfeitamente normal.
Tenho uma imensa riqueza de exemplos
de discordância com pessoas. Como fã de heavy metal, tenho grandes amigos que
nem de rock gostam. Como ateu, meu melhor amigo é evangélico, e minha esposa é
totalmente temente a deus. Como amante de gatos, tenho amigos que nem sequer
gostam de bichos. Como ideologicamente de esquerda, tenho familiares e
conhecidos que são filiados ao PSDB ou que acham o comunismo uma merda. Como
artista plástico, tenho amigos que são incapazes de compreender o brilhantismo
de Jackson Pollock.
Vivo discordando de todo mundo. Não
consigo aceitar algumas coisas que não fazem sentido só porque as pessoas acham
normal. E cada vez mais sinto uma necessidade grande de gritar isso aos quatro
ventos. Da mesma forma que as pessoas que discordam de mim vivem pregando suas
ideias e suas críticas, acho que temos o direito e o dever de mostrar o outro
lado da história. Nunca imaginei que as pessoas que pregaram o oposto do que eu
penso querem aparecer ou humilhar os outros. Apenas entendo que estão
espalhando seu ponto de vista.
Mas agora enfrento uma situação
diferente. Fui excluído praticamente da vida de dois amigos por causa da minha
atuação dentro de ideias religiosas e pela minha crítica política. Duas pessoas
que não suportaram ser contrariadas, ou que não tinham condições de encarar um
debate. E no acesso de fúria, fizeram o que eu fiz com a família da Joyce.
Soube que existe até uma discussão
por minha causa em páginas que eu não consigo visualizar. E as pessoas
continuam putas da vida porque minha opinião é “um desrespeito” ao que
acreditam. Discordo mais uma vez, e vou debater pelo que acredito seja certo. E
acho saudável e absolutamente normal uma pessoa discordar de mim, criticar,
expor o que pensa. Não vou ficar com raiva disso.
Não acredito que respeitar o próximo
seja ficar calado diante de tudo aquilo que você não acredita, ou sorrir
falsamente quando você está enfurecido com o que está sendo dito. Acredito que
respeitar o próximo seja aceitar que ele tenha um ponto de vista diferente do
seu e que pode expressá-lo quando achar que deve fazer. E respeitar o próximo
também não é deixar de discutir quando você julga correto, e sim discutir, com
o maior vigor possível, mas saber que aquilo é pura e simplesmente uma troca de
ideias e que a democracia se faz assim.
Por fim, deixo aqui meu mais sincero
voto de admiração para meu amigo Rodrigo Reis, que travou uma sequência épica
de discussões comigo, chegamos a exaltar os ânimos várias vezes, uma vez ou
outra até xingando, mas agimos como HOMENS agem, que travam esta guerra
ideológica, contestam seu adversário, mas não deixam que isso risque uma
amizade, mesmo que ninguém modifique seu ponto de vista. Esse é o tipo de cara
que agente tem que admirar de verdade na vida.
Nenhum comentário:
Postar um comentário