No filme “Nação
Fast Food”, de 2006, Avril Lavigne e seu grupo de ambientalistas invadem uma
fazenda que criava gado para abate, no intuito de vendas para uma empresa de
fast food, durante a noite, abrindo então as porteiras, uma vez que sequer
vigilância havia na fazenda, dando a oportunidade de que todas as vacas ali
presas pudessem escapar. Para surpresa do grupo, as vacas nada fazem, mesmo as
que olham para a porteira aberta. Nenhuma delas tenta sair, tenta lutar pela
liberdade ou pela própria vida.
Esta cena
ficou na minha mente desde que assisti ao filme, no ano de seu lançamento. E
este ano, com as manifestações pedindo o impeachment da presidente Dilma, a
primeira coisa que vem na minha cabeça é a cena do gado preferindo a morte
cruel à liberdade, quando vejo essas pessoas agindo da forma que vêm agindo. Em
virtude especialmente desta cena resolvi carinhosamente batizar estas
manifestações de “A revolta dos ruminantes”.
Não é de hoje
que nossa mídia apoia a direita, especialmente a mais radical e que busca
cortar liberdades. Não é de hoje que tudo aquilo que visa manter as imensas
desigualdades sociais no país tem sido propagado como se fosse vítimas de
injustiças. Não é de hoje que nosso sistema educacional é medonho, fazendo com
que as pessoas tenham cada dia menos capacidade de pensamento e de entendimento
de sua realidade.
Mas, mesmo
assim, ainda fico surpreso com as proporções que a situação tomou, uma vez que
é inegável a melhora extrema na qualidade de vida desde que o PT assumiu o
poder, desde 2002, mesmo que ainda esteja muito longe de uma coisa que possa
ser considerada boa. Isso tudo graças a notícias de corrupção, que sempre
aconteceram no Brasil, associada ao grande número de notícias bombásticas que
têm sido espalhadas em redes sociais, a maioria falsas, como a associação com
grupos comunistas, narcotráfico, que o filho do Lula tem ligação com a Friboi,
além de todo tipo de bobagem que possa ser pensado. Coisas que as pessoas não
só espalham como acreditam, sem qualquer verificação sobre a realidade dos
fatos.
Não gostar do
PT pra mim é algo normal, da mesma forma que não gostar de outros partidos.
Afinal, não me lembro de lideranças que passaram pelo governo sem grandes
escândalos de corrupção. No entanto, apesar de muitos desses grupos terem
ficado impunes, como ocorreu com os militares ou mesmo o grupo ligado a
Fernando Henrique, nunca houve uma grande mobilização para que essas pessoas
fossem barradas. Muito pelo contrário: nesta última eleição para presidente
Aécio Neves, um dos políticos com maior número de acusações em suas costas, foi
considerado como único salvador a ponto de tirar o PT do poder e tirar o país
do buraco. A ponto de agora as pessoas usarem camisetas afirmando não terem
culpa da situação, pois votaram no Aécio.
Este fato, por
si só já basta para demonstrar o quão imbecis estão as pessoas em nosso país.
Mas como temos um histórico lamentável de transformar políticos em heróis,
ainda vamos considerar como apenas mais um escorregão.
O que torna a
coisa ainda mais grave é que não existe um único fato que comprove ou que dê um
mínimo de sustentação para que haja impeachment. O processo é taxativo em suas
formas, descritas todas na nossa Constituição. A presidente, em seus oito meses
do atual mandato, não teve comprovado contra si nem o cometimento, nem sequer
envolvimento em qualquer tipo de crime, irregularidade ou problema administrativo
que possa sequer dar razão a um pedido formal de impeachment no Congresso. A
nossa oposição tenta desesperadamente que suas contas sejam reprovadas pelo TCU
para terem pelo menos uma argumento para que sustentem a natureza do ato.
Se nada
justifica, então não há impeachment. O que temos aqui, claramente, é um golpe.
Um golpe formulado por setores que têm interesse em colocar seus representantes
e que fizeram uma ótima campanha para convencer pessoas leigas que isso é o
desejo geral. E mesmo nossa lei maior sendo clara neste sentido, o povo não tem
sequer a vergonha na cara de ler o texto, que não é tão difícil assim, para
saberem se o que está sendo pedido tem algum fundamento.
Rasgar nossa
carta maior, ainda mais num ponto como estes, é deixar claro ao mundo que não
somos respeitáveis nem mesmo nas decisões tomadas pelo próprio povo. Aqui a
realidade pode mudar, de acordo com o humor coletivo, diante de qualquer tipo
de crise. Ninguém poderá mais confiar neste país, porque aqui nunca mais vai se
saber o que pode acontecer diante de um problema. Nem mesmo governantes de
direita terão tanta estabilidade assim, nem irão transmitir a confiança
necessária para que o país seja levado a sério.
Os resultados
desse tipo de ato são claros ao redor do mundo: guerras civis, quebra de
relações comerciais, fechada de embaixadas, expulsão de grupos comerciais,
perda de muito dinheiro e consequentemente de empregos. A única coisa que se
consegue com isso é o caos. Basta olhar o que ocorreu com o Paraguai anos
atrás. Ou como estão os países muçulmanos, em suas eternas ditaduras e
injustiças sociais. Nenhum país do mundo aceita mais este tipo de situação.
Atualmente,
nem mesmo alguns setores da mídia, outrora extremamente conservadores, estão
apoiando o golpe. Até mesmo a rede Globo passou a defender o mandato da
presidente. E não acreditem que de repente a emissora se converteu ao petismo:
ela sabe tanto que o país irá perder uma soma incrível de recursos, terá
praticamente o Planeta Terra inteiro contra ela, ao contrário do que ocorria
nas épocas da ditadura militar, nos anos 1960 e ainda por cima corre o risco de
ver o povo criar pequenas facções e se tornar incontrolável.
Vimos
recentemente um grupo sindicalista ameaçar pegar em armas se for preciso apra
defender a presidente. Não sei se foi uma figura de linguagem ou não, mas fica
claro que a semente do problema está lançada. Não vai demorar até que grupos
pró ou contra, num cenário golpista, comecem a agir e tenhamos a volta de
atentados e grupos guerrilheiros. Só não vê quem não quer.
Por todas
estas razões a situação é bem simples. Conhecimentos básicos da nossa
Constituição, aliados a conhecimentos básicos da história do nosso país e do
nosso planeta, em termos políticos, podendo apenas ser uma pessoa antenada em
noticiários diante da realidade social de diversos países do mundo, e uma
pequena, bem simples, análise econômica e social de quadros em que golpes
ocorreram demonstram claramente que apoiar um golpe é um erro absurdo e sem
sentido. É assumir uma burrice sem igual, como as pessoas que resolvem
protestar atenado fogo ao próprio corpo. Só que neste caso é ao próprio corpo e
a todos as demais pessoas que esitverem por perto.
Por tudo isso
essa situação não pode ter outro nome senão “A revolta dos ruminantes”. E peço
perdão a todos os burros, asnos, jumentos e mulas que puderem se ofender ao
serem comparados com seres humanos tão irracionais, mas não há como não
associar este comportamento tão estúpido.
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